Por: Régis Nepomuceno - Terapeuta Ocupacional

A palavra Rotina conota socialmente uma carga negativa de realização permanente das mesmas coisas, muitas vezes associada à inflexibilidades de tarefas, o que leva ao tédio e poucas oportunidades de aprendizado. Porém, o que ninguém coloca em questão são os benefícios de uma rotina estruturada e flexível. 

Para quem convive com pessoas com Autismo, a palavra tem um peso muito forte, já que alguns métodos e técnicas de trabalhos garantem que estas pessoas se tornarão independentes e funcionais se o dia a dia estiver extremamente organizado. 

Não encarando esta obrigatoriedade de uma maneira rígida, comparamos o desenvolvimento de pessoas sem autismo e percebemos que as pessoas aprendem, qualquer coisa que seja, através do decorrer dos seus dias, em todos os ambientes, ou seja, na escola, em casa, no shopping, ou mesmo na rua.

Trabalhar dentro da realidade de cada criança, encará-lo como ator principal de sua própria vida, entender a sua casa, a sua família, o seu meio, fará com que se torne mais seguro e eficaz em todas as tarefas da vida.

Quando consideramos a rotina de uma criança, pensamos em atividades que ela precisa desenvolver, entre elas: alimentação, autocuidado, brincadeiras, tarefas escolares, lazer, entre outras. Ao pensarmos na rotina de uma criança com autismo, terapias e outros cuidados são somados a essa lista. E então já é possível uma reflexão: será mesmo a rotina uma grande vilã ou podemos vê-la com um outro olhar? Será que a rotina é apenas uma grade horária difícil de cumprir? Será que tem que ser assim?

Se a criança aprende brincando, e muitas vezes imitando, por que não aprender agindo? Nem sempre é preciso brincar de vestir a boneca: é possível aprender a vestir-se, a cuidar do próprio material escolar, a entender de onde vem os alimentos, entender os contextos e o papel de cada atividade proposta. Não podemos esquecer que cada criança tem suas particularidades e nem todas conseguem entender algumas abstrações, portanto certas representações não trazem o resultado esperado. Se é assim, que tal trabalhar com situações reais?

 Ir ao supermercado, em alguns contextos, pode ser uma atividade enriquecedora. Criar hábitos de higiene também. Saber quais as etapas de cada atividade também podem trazer segurança na execução de tarefas mais complexas e, assim, o novo vai causando menos insegurança, vai tornando-se concreto. Será que tudo isso é ruim? Claro que não!

 A rotina não precisa aprisionar, pelo contrário, ela pode libertar. Libertar de inseguranças, de medos, desde que seja vista de maneira construtiva e acompanhada por profissionais especializados.

Se a aprendizagem de qualquer criança não está restrita à sala de aula, a de uma criança com autismo nem é e nem pode ser diferente. Cabe aos profissionais desenvolver contextos estimulantes em diversos ambientes e permitir que essa criança aproveite da melhor maneira a sua rotina. Em casa, na escola, no consultório. Com segurança, com liberdade para improvisos, alterações, mudanças. E com a certeza de que sentidos podem ser construídos a todo o momento, sem precisar, para isso, transformar sua casa num quartel, apenas um ambiente em que necessidades específicas são respeitadas.